quarta-feira, 9 de julho de 2008

[PGL] Um Manifesto nacionalista

A seguir, traduzido para galego, reproduzimos um interessante artigo de opiniom do linguista madrileno Juan Carlos Moreno Cabrera, publicado no jornal espanhol Público no dia 4, sobre o manifesto promovido por 'intelectuais' espanhóis contra as línguas 'cooficiais'

Um Manifesto nacionalista

4 de Julho de 2008

O ‘Manifesto por la lengua común’ apresentado no passado mês de Junho em Madrid começa com a seguinte afirmaçom: “Todas as línguas oficiais no Estado som igualmente espanholas […] só umha delas é comum a todos […] portanto só umha delas –o castelhano– goza do dever constitucional de ser conhecida”. Este enunciado contém umha contradiçom que percorre de cima abaixo todo o manifesto. Consiste em afirmar, por um lado, que todas as línguas oficiais som igualmente espanholas e, por outro, que apenas umha delas goza do dever constitucional de ser conhecida. Quer dizer, nom todas as línguas oficiais som igualmente espanholas: umha é muito mais espanhola do que as outras. Nom só isto; é que, além do mais, se contradi de forma palpável o segundo ponto do comunicado. Com efeito, a seguir di-se que “som os cidadaos que tenhem direitos lingüísticos, nom os territórios nem muito menos as línguas mesmas”. Se isto é assim, entom nom devia ter-se dito no ponto primeiro que o castelhano goza do dever constitucional de ser conhecido, porque as línguas nom gozam de direito ou direito nengum. Aqui percebe-se de forma cristalina o nacionalismo lingüístico castelhanista imperante no manifesto: só som as restantes línguas espanholas que carecem de direitos; o castelhano tem todos os direitos do mundo.

Mas, só as pessoas individuais tenhem direitos e deveres? Que se saiba, existe umha entidade política denominada Espanha, com um território bem definido e em que há umha língua oficial denominada espanhol. Essa entidade define-se, entre outras cousas, mediante o direito a usar essa língua em todo o território do Estado e em todos os organismos oficiais. Será que nom está associada Espanha a direitos lingüísticos e territoriais? Nom tem exercido em mais de umha ocasiom Espanha, através dos seus representantes, o direito a que o espanhol seja reconhecido na Uniom Europeia como língua oficial que é de um Estado membro?

No ponto terceiro di-se “nas comunidades bilíngües é um desejo louvável aspirar a que todos os cidadaos cheguem a conhecer bem a língua cooficial. Mas tal aspiraçom pode ser somente estimulada, nom imposta”. Conhecer a língua oficial do Estado nom é um desejo louvável, mas um imperativo legal. Por isso, quem trabalha nas instituiçons do Estado é obrigado a usar o castelhano. Ora, se o catalám é oficial na Catalunha, quem exerce as suas funçons nas instituiçons catalás deveria da mesma maneira ser obrigado a usar o catalám. Esta obrigaçom está legalmente legitimada polo facto de o catalám ser língua oficial. É umha incoerência evidente exigir que na Catalunha se fale e escreva em castelhano porque é língua oficial e nom fazer a mesma cousa em relaçom ao catalám, a outra língua oficial, ou será que a primeira é mais oficial do que a segunda?

No ponto quarto, afirma-se que o facto de as línguas das comunidades autónomas terem deixado de ser proibidas ou restritas é avondo para o pleno cumprimento da alínea três do artigo terceiro da Constituiçom. Mas o que di a lei é que as línguas nacionais das comunidades autónomas som oficiais e, portanto, exigir essas línguas aos seus cidadaos nom é acto de discriminaçom em relaçom à outra língua oficial, o castelhano. O que sim é um acto de discriminaçom é nom exigir a todos os cidadaos das Comunidades as suas línguas nacionais, como línguas oficiais de pleno direito que som, ou que deveriam ser.

A continuaçom, fai-se umha série de pedidos ao Parlamento espanhol. O segundo deles consiste em solicitar que “as línguas cooficiais autonómicas devem figurar nos planos de estudo […] mas nunca como língua veicular exclusiva”. Isto equivale a pedir, por exemplo, que na Catalunha tenha de exigir-se por lei que nom se ensine em catalám. Mas, como pode ser isto conciliado com a ideia de que o catalám é língua oficial na Catalunha? Acho que nom há maneira sensata de o fazer. No ponto terceiro insiste-se na ideia de que nem todos os funcionários públicos das comunidades autónomas tenhem que conhecer a língua oficial da sua comunidade. Isto volta a entrar em contradiçom com o seu carácter oficial. É possível ser funcionário público da Administraçom do Estado sem conhecer o espanhol? Se isto nom é possível, porque teria de ser que um funcionário público da Generalitat nom saiba catalám?

Em conclusom, o que parece pedir-se neste manifesto é que as línguas das diversas comunidades autónomas deixem de ser de facto oficiais nelas para voltarem a umha situaçom em que o castelhano seja a única língua realmente oficial em todo o território do Estado espanhol.

Estamos, pois, perante um manifesto em favor da supremacia e domínio absolutos da língua espanhola sobre todos os restantes idiomas de Espanha. Por esta razom, é um claro expopente da ideologia do nacionalismo lingüístico espanhol numha das suas formas mais radicais e megalómanas. Consoante esta ideologia, o espanhol, língua oficial do Esetado, é superior nalguns aspectos à prática totalidade das línguas do mundo. No preámbulo do manifesto menciona-se que apenas há duas línguas com maior pujança do que o espanhol (o chinês e o inglês) e que esta língua se associa por direito próprio à comunicaçom democrática e aos direitos educativos e cívicos. Com premissas como estas, nom admira a atitude soberba e intolerante que dá forma ao manifesto em todos os seus pontos.

Juan Carlos Moreno Cabrera é catedrático de Lingüística Geral na Universidad Autónoma de Madrid e autor de El nacionalismo lingüístico. Una ideología destructiva.

Fontes: PGL e Público.

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